Quando as autoridades ambientais americanas decidiram reintroduzir o furão (Mustela nigripes) nas pradarias do estado de Montana como parte de um plano para salvar a espécie da extinção, elas sabiam que enfrentariam resistência por parte dos pecuaristas locais. O furão depende obrigatoriamente do cão-da-pradaria (roedor do gênero Cynomys) para sobreviver, alimentando-se dele e usando suas galerias subterrâneas como refúgio. Acontece que o cão-da-pradaria é considerado uma praga pelos pecuaristas devido aos estragos que causa às pastagens. A reintrodução do furão implicava na convivência forçada entre pecuaristas e o indesejável roedor. Cientes da importância do apoio popular para o sucesso do programa de reintrodução do furão, as autoridades conduziram uma campanha de informação que visava aumentar o conhecimento dos pecuaristas sobre a biologia e ecologia da espécie. Partiram da premissa de que conhecimento e atitude andam de mãos dadas: quanto mais os fazendeiros soubessem a respeito do furão, mais positivas seriam suas atitudes em relação ao animal e, consequentemente, à sua reintrodução. Ao final da campanha de informação, as autoridades constataram que as atitudes dos fazendeiros em relação à reintrodução do furão haviam de fato mudado, porém na direção contrária ao esperado: os fazendeiros tinham se tornado ainda mais resistentes à reintrodução do furão em suas propriedades!
Sentimentos negativos
Esses resultados têm implicações importantes para os conservacionistas engajados em obter o apoio da população às suas ações: compartilhar informações e fatos com o público não resulta necessariamente em atitudes mais positivas, pois conhecimento é apenas um entre os vários fatores que determinam as atitudes. O conhecimento adquirido pelos fazendeiros de Montana parece ter sido “filtrado” da maneira que lhes convinha e usado para racionalizar, justificar e reforçar seus sentimentos negativos já existentes ao invés de servir para formar uma opinião mais positiva sobre o furão. Resultados parecidos foram registrados em campanhas para a conservação de outras espécies pelas quais as pessoas diretamente envolvidas têm sentimentos fortes e arraigados de raiva e medo, como lobos e ursos.
Aumentar o conhecimento e melhorar as atitudes em relação à vida silvestre estão entre os objetivos da educação ambiental. A exemplo da educação em seu sentido mais amplo, a educação ambiental está comprometida com os fatos e busca a imparcialidade, mostrando todos os lados da verdade. Como a verdade é que nossa existência depende de animais, plantas e ecossistemas, é razoável esperar que cidadãos bem informados vão agir de forma ambientalmente responsável. A ecologia ensina noções de interdependência e a conclusão lógica de tais lições é a seguinte: o que é bom para o homem é bom para as demais espécies e vice-versa.
Acontece que nem sempre agimos de forma lógica e racional e, para tornar a vida dos educadores ambientais ainda mais difícil, nem sempre o que é melhor para o homem é bom para todas as espécies. No exemplo de Montana, o melhor para os fazendeiros era continuar sem os furões. Embora legítimo em seu cuidado de ensinar “como pensar” e não “o que pensar”, o educador conservacionista que se limita a aumentar o conhecimento de seu público a fim de “empoderá-lo” (com o perdão do desagradável neologismo) corre o risco de vê-lo tomar decisões que não são compatíveis com os objetivos da conservação.
Se de um lado a educação visa promover, a longo prazo, uma ética de conservação que se traduza em um modo de vida ambientalmente responsável, de outro a comunicação para a conservação tem como objetivo modificar, a curto prazo, comportamentos específicos, fazendo uso dos métodos da comunicação, incluindo as técnicas comprovadamente efetivas de marketing. Conhecimentos e atitudes, por si só, não fazem bem ou mal ao meio ambiente. Comportamentos humanos, estes sim, têm causado os grandes estragos ao meio ambiente, embora também pese sobre eles boa parte da esperança de solução para os problemas ambientais.
Exemplos de intervenções de comunicação para a conservação que visam modificar comportamentos específicos (isto é, promover comportamentos compatíveis e desestimular comportamentos incompatíveis com conservação) vão desde um simples sinal de trânsito ao lado da rodovia indicando a travessia que animais silvestres, o que faz com que os motoristas reduzam a velocidade e redobrem a atenção e, desse modo, evitem atropelamentos, até campanhas com apelos emocionais e sociais utilizando diferentes mídias para criar ou reforçar a percepção de que determinado comportamento, comprar animais silvestres, por exemplo, é reprovável dos pontos de vista moral e social.
Como Comunicar
Por ter um foco mais estreito, a comunicação é mais efetiva que a educação em mudar comportamentos específicos. Uma prova disso é o padrão de consumo dos jovens: são principalmente os profissionais de marketing (os grandes especialistas em mudança de comportamento) que, por meio da propaganda, definem – de forma específica – o que e quanto os jovens vão comprar, apesar das repetidas lições dos educadores ambientais sobre como o consumo – de forma geral – ameaça o meio ambiente. Por outro lado, o simples termo “modificar comportamento” pode causar desconforto em alguns círculos. O uso de métodos persuasivos e a comunicação parcial dos fatos, tipicamente usado em propaganda para influenciar comportamentos, pode ser interpretado como doutrinamento ou, no mínimo, como uma indesejável imposição de valores. Isso suscita questionamentos acerca da legitimidade dessa abordagem, especialmente entre os educadores acostumados a pensar na pedagogia como ferramenta de libertação e de autonomia.
Ética
A conservação da biodiversidade, no entanto, é uma disciplina que tem seus valores próprios. Enquanto a ecologia se alinha com a noção tradicional de que “ciência é neutra” e trata estritamente de desvendar a verdade por trás do mundo natural sem fazer juízo de valor, a conservação, por outro lado, nasceu em resposta a um problema – a perda de biodiversidade – e tem como missão resolvê-lo. Enquanto em ecologia não existe o bem e o mal, nem melhor e pior, a conservação possui uma ética particular, sintetizada por Aldo Leopold em A Ética da Terra (no clássico A Sand County Almanac) como “uma coisa está certa quando tende a preservar a integridade, a estabilidade e a beleza da comunidade biótica; está errada quando tem a tendência inversa”. Errado em conservação é o comportamento humano que ameaça a biodiversidade. Portanto, o papel do educador e comunicador conservacionista é, por definição, usar a educação e a comunicação para mudar o comportamento humano em benefício da biodiversidade.
Claro que, como cidadão, o educador e comunicador conservacionista deve evitar o conflito entre os interesses da conservação e os dos segmentos sociais afetados. A participação pública no processo de tomada de decisões é umas das abordagens geralmente associadas à educação e comunicação como uma maneira de fortalecer a legitimidade e aumentar a efetividade da conservação. Antes de mais nada, porém, o educador e comunicador conservacionista deve entender o seu público. Mais especificamente, ele deve conhecer os diferentes fatores que determinam os comportamentos de relevância para a conservação. Exemplos de tais fatores são as necessidades e expectativas, os valores, sentimentos, conhecimentos, crenças, atitudes e normas sociais. A fim de pesquisar, entender, prever e melhor influenciar comportamentos, o educador e comunicador conservacionista deve lançar mão das teorias e métodos das ciências sociais, em particular do emergente campo da Psicologia da Conservação. Tema para uma próxima coluna.
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