Ilha Grande tem pouco tempo para lamentar desastres como o deslizamento de terra que matou 32 pessoas na Enseada do Bananal, no Ano Novo. Logo mais, no Carnaval, a ilha voltará a ficar lotada de turistas e não apenas as pousadas estarão pressionadas, mas o sistema de fornecimento de água, energia, a qualidade das trilhas e das praias. Apesar disso, o chefe do Parque Estadual de Ilha Grande (PEIG), Izar Aximoff, diz que algo já começou a mudar.
Pela primeira vez, os moradores das praias de Araçatiba, Provetá, Vermelha, Castelhanos, Aroeira, Pouso e Mangues foram intimados a apresentar a documentação de suas propriedades. Durante a operação, realizada no início do mês, 175 edificações foram vistoriados. Apenas 27%, em um levantamento preliminar, tinham algum tipo de certidão (registro, recibo, escritura, contrato ou IPTU). Os responsáveis já foram notificados a apresentar as licenças ambiental e de obras.
Também estão previstos trabalhos mais intensos para identificação de outras áreas de risco e planos para ampliação do parque estadual já nos próximos meses. Mas ações anunciadas como exemplares, como a contratação de guarda-parques, ainda não aconteceram de fato. Sua chegada está prevista para o mês que vem, segundo contou Aximoff, na entrevista completa que você confere a seguir.
O Eco – O deslizamento de terra na praia do Bananal começou acima da cota dos cem metros, portanto dentro dos limites do parque. O que está sendo feito para evitar novas tragédias?
Izar Aximoff (IA) – Alguns dias depois da tragédia, cerca de 30 técnicos realizaram uma espécie de caracterização ambiental de toda a Ilha, visitando principalmente as áreas afetadas pelos deslizamentos. Contamos com apoio do Ibama, do Grupamento Aero Marítimo da Policia Militar (GAM), do Ministério da Saúde, Secretaria de Estado do Ambiente, entre outros, para realizar o trabalho. Percorremos a ilha de helicóptero, de lancha e a pé. O PEIG, além de receber a todos, deu apoio logístico, administrativo e pessoal.
O Eco – Vocês já identificaram as pessoas que vivem em áreas de risco?
IA – Eu e outros funcionários do PEIG estivemos envolvidos, por mais de uma semana, realizando o levantamento das informações e produzindo o relatório junto com a Coordenadoria Geral de Fiscalização, Gerência de Unidades de Proteção Integral e, também, de Uso Sustentável do Inea [Instituto Estadual do Ambiente do Rio]. O relatório foi entregue ao Conselho Diretor do órgão, que encaminhou recomendações para os diversos atores com responsabilidade na área, como Prefeitura, Defesa Civil Municipal e também para APA Tamoios e PEIG. Estas recomendações estão sendo discutidas nos conselhos gestores das unidades de conservação para identificar com a comunidade quais devem ser as próximas ações e o que precisamos para tal.
Aos poucos estamos recebendo os moradores de áreas de risco que foram notificados a apresentar documentos e licenças. Já identificamos que existem muitos em situação regular ou mesmo com casas mais antigas do que a criação da APA Tamoios. Contudo, há aqueles sem licença e sem consciência ambiental, que colocam as casas em áreas de risco. Infelizmente, o poder público não tem pernas para coibir este tipo de situação que existe em todos os lugares.
O Eco – A proposta de ampliação do parque vai sair do papel?
IA – A ideia é aproveitar este momento para ampliar um pouco mais o PEIG. Esta ampliação deve pegar áreas consideradas de risco, a fim de evitar o crescimento dos povoados para estes locais. O aumento não deve ser expressivo, mas providencial. Acredito que, para os próximos meses, os resultados dos estudos, da operação e das discussões com os Conselhos indicarão o melhor momento para tal.
O Eco – Como a população da Ilha Grande vê o parque?
IA – Muitas vezes não tenho fiscal no PEIG e aí complica mais ainda, pois não conseguimos atender às demandas de denúncia, o que parece negligência de nossa parte. Com a finalização do plano de manejo da UC para este semestre, acredito que a gestão vai melhorar muito, em grande parte apoiada no Conselho Consultivo do PEIG, que é muito bom. Como chefe do PEIG, preciso trabalhar muito bem a imagem da UC – já que, para grande parte dos moradores da Ilha, ela é negativa e relacionada à fiscalização. Nossas ações têm sido voltadas em grande parte para isso.
O Eco – Quais são os maiores desafios de gerenciar um parque tão procurado por turistas?
IA – Segundo dados da prefeitura [de Angra dos Reis], a Ilha Grande recebe, por ano, cerca de 300 mil pessoas. É razoável colocarmos que 70% deles visitem a área do parque. Em relação à gestão propriamente dita, os maiores desafios são basicamente oriundos de problemas que estão fora dos limites do parque. Por exemplo, falta de ordenamento territorial, presença do poder público (principalmente municipal) e consciência ambiental geram problemas que, muitas vezes, nos afetam. Tenho conseguido diminuir um pouco a questão de não resolvermos demandas que não são de responsabilidade do PEIG e que antes tomavam muito de nosso tempo, como a fiscalização na área da Área de Proteção Ambiental (APA) Tamoios, autorizações de corte e poda de árvores etc.
Outro exemplo disso está relacionado à questão dos milhares de cães e gatos que estão nas áreas da APA Tamoios (Abraão e outros povoados) e são de responsabilidade do município de Angra. Acontece que, mesmo existindo uma lei municipal de 2007 para regular esta questão, nada é feito e a grande quantidades desses animais em todos os lugares (praias, trilhas, praças etc) trazem riscos à saúde humana e à própria biodiversidade do PEIG. Recebemos, há alguns meses, um indivíduo macho do macaco bugio (animal ameaçado de extinção e símbolo do PEIG) ferido por cachorros e que acabou morrendo em Angra após os primeiros socorros da veterinária do Ibama.
O Eco – Você acha possível que o parque se sustente um dia só com turismo?
IA – Em breve, com a publicação do Decreto de Uso Público, as unidades de conservação poderão vislumbrar a possibilidade de se tornar sustentadas inteiramente (ou em parte) pelo turismo. Para isso, preciso oferecer um produto de qualidade e que deverá envolver toda a comunidade da Ilha, porque não adianta nada criarmos a melhor estrutura e os turistas não terem boas opções de estabelecimento. O sucesso do PEIG depende da boa recepção dos turistas na Ilha por parte dos hoteleiros. Eles só virão para a Ilha se as condições ambientais estiverem melhores, e aí dependemos da prefeitura. Se todos trabalharmos juntos, o PEIG será um parque modelo.
O Eco – É isso que o governo do Rio vive dizendo, que o PEIG será referência, inclusive com a 1ª turma de guardas-parques. Isso já é uma realidade?
IA – A Ilha Grande, e por tabela o PEIG, está entre os principais destinos turísticos do Brasil. Quando o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, estava à frente da secretaria do estado, ele sempre tratava o PEIG como o parque modelo e a menina dos olhos do Rio de Janeiro. A responsabilidade e o desafio são enormes e, desde setembro do ano passado, tenho percebido isto diariamente. A experiência que acumulei ao longo de minha vida profissional, como estudante, pesquisador, professor, subsecretario municipal de meio ambiente e outras funções, tem me ajudado um pouco, mas, como bom biólogo, sei que a administração para gestão ambiental e de pessoas não é nada fácil.
Tenho me preparado cada vez mais para esta função de chefe de parque modelo em pleno Rio de Janeiro, sabendo que temos o apoio financeiro da Vale para os próximos 5 anos. Por enquanto, os guardas-parques ainda não chegaram, mas são prometidos para o mês que vem. Para a Ilha, serão destacados 20 bombeiros, sob responsabilidade do Instituto Estadual do Ambiente (INEA), e que terão poder de fiscal, o que vai ajudar muito. Com eles trabalhando poderemos utilizar parte da equipe atual de guardiões para trabalhos de interpretação ambiental – estamos montando um curso permanente de capacitação. Preciso atender cada vez melhor o público que visita o PEIG.
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