Há doze anos o Projeto de Lei da Mata Atlântica (PL 3.285/92) espera para ser aprovado em Brasília. Em dezembro do ano passado, o plenário da Câmara o aprovou por unanimidade, mas um forte lobby o mantém parado no Senado. Como paciência tem limite, a Fundação SOS Mata Atlântica fez um levantamento de processos relacionados a questões ambientais em tramitação no Congresso e criou o Observatório Parlamentar da Mata Atlântica. O objetivo é simples: informar a sociedade sobre os passos do legislativo na área ambiental e estimulá-la a pressionar os congressistas. Afinal, as eleições são em 2006 e os partidos querem votos.
O trabalho de compilação feito pela fundação SOS Mata Atlântica foi apresentado na terça-feira, 9 de novembro, a um grupo de deputados envolvidos com a pauta ambiental. Segundo Mario Mantovani, diretor institucional da Fundação SOS Mata Atlântica, os lobbies são um problema constante. Na Câmara, o deputado paulista Ricardo Isar tentou acabar com as áreas de preservação permanente nas áreas urbanas em nome do setor imobiliário. Mas a pressão mais forte é feita pelos ruralistas. O Projeto de Lei da Mata Atlântica impede a exploração de vegetação primária, de áreas em regeneração avançada e estabelece regras rígidas para a exploração de áreas em estágio médio de regeneração. Atualmente, um grupo de ruralistas sugeriu aprovar o projeto de lei em troca da redução da reserva legal da Amazônia, de 80% para 50% da área protegida na região.
Outra pedra no caminho da aprovação do projeto no Senado é a bancada do PFL. Ela não abre mão do direito de indenização caso a aplicação da lei reduza o potencial econômico da propriedade rural. O senador César Borges (PFL-BA) defende alterações no conteúdo do projeto. Se isso acontecer, o PL da Mata Atlântica terá que voltar para a Câmara dos Deputados. “Estamos nos dedicando a pressionar o senador César Borges para ver se ele cede e para que, se tiver alterações, elas possam ir o mais brevemente para a Câmara dos Deputados”, diz Mário.
Mas Mário Mantovani reconhece que o mais atrapalhou a aprovação do PL durante os últimos 12 anos foi o fato de a sociedade civil não estar envolvida e não ter conseguido dar peso político à questão. A finalidade do Observatório Parlamentar é consertar esses erros. A SOS Mata Atlântica quer transformá-lo em um mecanismo de prestação de contas do legislativo para com a sociedade. O seu conteúdo está disponível no site da fundação e será constantemente atualizado com o acompanhamento das leis, de maneira que a população poderá conhecer e fiscalizar as decisões do Congresso em relação ao meio ambiente. “No próximo ano vamos apresentar os deputados e seus pensamentos.” revelou Mário.
O site é bem didático, exatamente para quem não tem intimidade com os trâmites do legislativo. Explica como nasce uma lei, o que é um projeto de lei, o que é uma medida provisória e como se faz o orçamento. Também tem glossário e definições de siglas.
O conteúdo do Projeto de Lei da Mata Atlântica foi simplificado e divido em tópicos, o que facilita a leitura. Ali, em poucas linhas, está a história da Mata Atlântica. O documento lembra que originalmente a floresta cobria uma área superior a 1,3 milhão de km2 (o equivalente a 13,04% do país), distribuída por 17 estados, e que hoje resta apenas 7,3% desse total. Durante os 12 anos que se passaram sem a aprovação do PL, a Mata Atlântica perdeu mais de 10 mil km2. Atualmente, o ritmo do desmatamento é de um campo de futebol a cada 4 minutos.
Mesmo bastante reduzido e fragmentado, esse ecossistema ainda tem muito valor. O Observatório Parlamentar afirma que a Mata Atlântica influencia diretamente a vida de mais de 80% da população brasileira. Ela regula o fluxo dos mananciais hídricos, a fertilidade do solo, controla o clima e protege escarpas e encostas das serras. A Mata Atlântica também abriga nascentes de rios que abastecem cidades e é cortada por rios importantes como o São Francisco, o Tietê, o Paraíba, o Paraíba do Sul e o Paraná. Ela garante o abastecimento de água para mais de 120 milhões de pessoas.
O Observatório também divulga proposições em tramitação no Congresso, como a que penaliza a biopirataria. O visitante também pode ver o que foi gasto do orçamento da União este ano com questões ambientais. Com a despoluição das lagoas, por exemplo, não foi gasto nenhum centavo.
Segundo Mario Mantovani, existem cerca de 70 deputados e alguns senadores a favor da causa — tirando aqueles que só querem “aparecer bem na fita”. “É um bom número, mas precisamos de mais estrutura e respaldo na participação dos eleitores para dar peso aos temas que eles defendem”, conclui.
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