Grande parte da produção industrial atual não se preocupa com o ciclo de vida dos materiais e tampouco se importa com relações culturais dos indivíduos com os objetos. Mas apesar das inúmeras “quinquilharias” produzidas por este sistema, ainda é possível vislumbrar na Amazônia brasileira a produção de muitos artefatos que nasceram dentro, e no ritmo, da natureza.
Tamanho antagonismo foi o que motivou Andrea Bandoni, mestre em Desing Conceitual pela Design Academy Eidhoven na Holanda e Arquiteta pela FAU USP, a percorrer 2 386 km em busca deste preciosos objetos.
Como numa brincadeira de “caça-ao-tesouros”, o primeiro deles foi encontrado em Belém, capital do Pará. Exposto numa banca do mercado Ver-o-Peso, o “tipiti” despertou a curiosidade de Andrea. Ela descobriu que o instrumento de palha é usado para tirar a água da mandioca na produção artesanal de farinha, um objeto indispensável durante muito tempo para a sobrevivência na região amazônica. O “tipiti” foi o estalo que a designer precisava para escrever o projeto Objetos da Floresta.
“Fiquei pensando que deveria haver outros objetos como esse desconhecido para mim, que mostram uma surpreendente e equilibrada relação entre homem e a natureza. Quis explorar a região amazônica para encontra-los”, disse em entrevista ao ((o))eco.
Criado com a proposta de registrar e divulgar objetos que estejam intimamente relacionados com a realidade da floresta amazônica brasileira de maneira sustentável, o Objetos da Floresta documentou através de um e-book bilíngue (inglês e português) uma amostra de produtos inusitados, mas muito úteis.
Como numa homenagem, o “tipiti” abre a exposição de 12 objetos confeccionados nos mais diversos materiais: casa de caba, cuia, língua de pirarucu, apito, rede, panacu e jamaxim, cuia-de-macaco, tecido, espata de palmeira e o brinquedo de mirit. Todos registrados com detalhes que vão desde sua composição a utilidade.
“Cada dia uma nova descoberta me esperava, seja um objeto diferente, um material que eu nunca havia imaginado ou um processo de confecção extremamente limpo”, lembra a designer.
Segundo Andrea, o projeto não teve a pretensão de fazer um mapeamento preciso, nem de colocar os objetos como os únicos ou como sendo os mais importantes da região. “A seleção foi feita com base no que foi encontrado”, diz.
Para chegar as descobertas, a designer dividiu o projeto em três frentes de execução. Durante um mês realizou uma viagem exploratória visitando pontos estratégicos na Amazônia brasileira, com a intenção de identificar e registrar objetos contemporâneos que tenham uma relação única com a natureza e que sejam representativos da cultura material local.
Após essa primeira etapa, Belém e Manaus sediaram workshops gratuitos voltados para designers, arquitetos e criadores, que ajudaram a selecionar os produtos que compuseram o e-book, última etapa do projeto.
Nova referência
“Vivemos num mundo extra-saturado de objetos, imagens e símbolos, sem mais espaço para lixo. É papel do designer imaginar um novo sistema, pós-industrial, considerando como os materiais podem não apenas deixar de prejudicar pessoas e ambiente, mas também como podem ter impacto positivo”, diz Andrea.
A designer conta que para chegar nesse “patamar” ainda há muito que percorrer dentro da profissão. Mas em busca de referencias, designers de todo o mundo estão se aproximando da natureza, assim como um cientista natural, para identificar oportunidades, descobrir novos materiais, texturas e processos, repensar o uso dos recursos e produzir artefatos mais adequados e representativos para a atualidade, explica Andrea.
E neste ponto, os designers brasileiros saem na frente. “Na maior e mais diversa floresta do mundo, a Amazônia, é possível ver de perto e interferir em processos naturais. Acho que para abrir os olhos para esta riqueza é preciso simplesmente estar interessado nela”, anima-se.
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Objetos da Floresta – Diário
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